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Uma cronologia pessoal .Trajetos de Esther Casanova.

“No hay como creer en lo que afirmamos para estimar que nuestra creencia será aceptada y seguida por todos. Ahora se despojarían de sus trágicos envoltorios y prorrumpirían en una profunda salutación a la vida.”

Percursos cromáticos que deslizam desejos caracterizam, em síntese, as obras da série Trajetos, que nos apresenta Esther Casanova. Desejos representados, cuja origem vem dos percursos pessoais da artista pelos entornos de espaços físicos em diferentes cidades e vários países. A justaposição das imagens e suportes materializa as composições plásticas em contexto. Fotos transferidas para acetatos, desenhos, imagens de circulação em massa, elementos, todos, manipulados pela artista. O resultado é uma mudança radical nas referências literais dos seres humanos; é o desafio de transformar, dar um novo significado ao original. Como coloca a própria artista, “é desafiar para ter sentido”. A composição resultante transborda cromatismo e simetria, e “tem um pouco de mistério”, como confirma Casanova. Nesse mistério descrito pela artista, estrutura-se a própria análise da composição. Como num quebra-cabeça, o espectador se depara com um labirinto de possibilidades que formam o todo; labirinto recriado a partir do processo reversível de “um a cada vez ou todos ao mesmo tempo”2.

A busca, o imprevisto, as novas descobertas que Casanova propõe recriam, no espectador, jogos de estímulos sensoriais, de lembranças; provocam reações sugestivas que transitam entre suportes, técnicas e estilos artísticos. Criam-se, assim, transições sensoriais graduais e sutis entre as partes, o todo e o conjunto de obras entre si.

A artista intensifica uma simetria que se dilui em formas que, por sua vez, se estruturam em correntes pictóricas de luz e metáforas de composições. Correntes cromáticas sustentadas na instantaneidade e no transitório, e que provocam a aparição, híbrida, de novos significados plásticos.

Há, assim, um espírito analítico na forma de estruturar a composição das formas. Símbolos e consequências na produção de uma artista que sintetiza, em suas obras, as possibilidades complexas que a pintura, por exemplo, oferece, fundamentadas, essas possibilidades, na investigação artística.

A composição, com originalidade marcante e própria, revela o todo, bem como a fascinação e a reação da artista pelo predomínio e intensidade das partes nele contidas. Na série Trajetos, os processos de evolução na pesquisa e maturidade autoral na produção de Casanova são evidentes. Revela-se, aqui, que “o passado, sem deixar de conservar o atrativo do fantasma, retomará a luz e o movimento da vida e se tornará presente”3.

Portanto, a produção de Esther Casanova pode ser considerada intelectual e pictórica, despojada de convencionalismos, como uma profunda saudação à vida.

Andrés I. M. Hernández
Mestre em Artes Visuais
São Paulo, 13 de março de 2013

Materialidade, geometria e cromatismo na produção plástica de Esther Casanova

Contenção, deslocamento, limites, desdobramentos, formas, técnica, imersão, abordagem, transparência são termos que se materializam na produção de Esther Casanova.

Casanova aborda diferentes temas sobre diversos suportes. Seus trabalhos retomam e atualizam técnicas formais da história da arte e as projetam com viés e discussão contemporâneos.

Nas diferentes séries, a transmutação na estrutura, a cor, a luz são evidentes. A artista explora esses elementos e lhes dá uma distinção particular, emprestando-lhes configuração, simbologia e contextualização. Aparecem, assim, significados particulares nas tonalidades e nas linguagens estética, formal e conceitual, mobilizando, dessa forma, conteúdos subjetivos da própria coletividade, ao transitar desde uma posição singular/individual até uma discussão plural/coletiva, que evidencia que os índices precisos da memória coletiva constituem emblemas da identidade do próprio artista.

A geometria rege a composição e a criação nas obras de Casanova.


Formas representadas em espaços pictóricos ricos em planos e sequências, linhas e contornos que estruturam a materialidade visual das obras da artista, diversificando os ângulos de visão e contemplação do espectador.

As linhas são itens recorrentes nos trabalhos apresentados; linhas que se expandem sobre os diversos suportes e que são fronteiras para depois segurar o amálgama cromático que estrutura cada peça. Elas definem, por exemplo, a série de cabeças que configuram as esculturas em arame e aparecem representadas no registro fotográfico das mesmas.

Já na série sem título, simultaneamente e de forma reversível, as linhas se diluem na composição, anulando, nos traços, seu valor próprio. Formulam-se, assim, relações híbridas entre forma e conteúdo. A superfície da tela se ilumina na ação comedida de desdobramentos cromáticos que conduzem a uma representação geométrica e conceitual de tons e sequências de inigualável riqueza lírica e material.

Na série Metrópole, o registro cartográfico é resultado do percurso diário da artista pela cidade. As linhas aparecem aqui como contorno e geometria dos prédios que ela representa em cada tela.

Em algumas sequências, aparecem os contornos dos prédios, dos espaços que os compõem; mas, em outras, a difusão cromática se expande, de forma a não deixar a definição espacial aparente.

Nessa série, a intensidade cromática se dilui na composição para deixar em realce a coloração da fronteira na composição, provocando contrapontos espaciais entre os elementos representados e o espaço pictórico, sem alteração no seu formato original. Esta diferença nas tonalidades em cada peça nos remete a aspectos subjetivos do eu e do outro.

A luz se converte num elemento básico na linguagem plástica da artista, estabelecendo nexos nos contrastes com as sombras, definindo conexões entre claros e escuros, e equilíbrio/desequilíbrio matérico e cromático. Na série dos backlight, por exemplo, a luz artificial se difunde e reforça o cromatismo da criação plástica.

Caudais de movimento, são representados pelo direcionamento espacial e cromático das linhas e marcas de cor provocadas pelas pinceladas nas obras abstratas. Um movimento sequencial de deslizamento ou confronto que nos remete, num primeiro contato, às vivências na natureza e, numa leitura posterior, vinculada à história da arte, à instabilidade conceitual da pintura.

Tempo e espaço ganham destaque na representação cromática. Assim, a artista recorta espaços definidos de um todo – tornando visíveis fragmentos imperceptíveis do cotidiano – e elabora formas que estruturam essas partes como elementos únicos que se materializam na cor, nos contornos, na textura.

Há nas séries de Casanova uma transparência visual que nos deleita ao se isolar da irresistível quantidade de informações inúteis e fúteis que nos bombardeiam diariamente. A artista nos oferece uma produção carregada de lirismo e fluidez visuais que nos isola e nos transporta para uma realidade imaterial fértil de luz e vontade de viver.

Pinceladas marcantes que se entrecortam e diluem em um vendaval cromático sequencial e ao mesmo tempo corpóreo e anacrônico na linearidade espacial. Fortes contrastes de cores que projetam e realçam uma transparência luminosa e uma relação ótica de formas e profundidade que fomentam o conjunto pictórico.

A dinâmica espacial que os trabalhos nos oferecem se traduz no deslocamento pictórico e na criação de planos que se diluem e fundem de tal forma que hibridizam e contextualizam a composição simultaneamente a partir de materialidade e estética complexas e coerentes. Contrapontos de circularidade e linearidade de parâmetros estéticos e plásticos configuram e definem os trabalhos de Casanova.

Andrés I. M. Hernández
Mestre em Artes Visuais, Curador e Produtor
São Paulo, março de 2011


Linha, síntese de beleza e exatidão

Se a arte é o veículo de uma percepção especial de mundo, o artista é o agente que mais tem condições de elabora-lo. Para a concretização de seu objetivo, não basta realizar a obra, deve transmiti-la ao observador da forma mais simples, mais clara, mais sóbria possível (Karl Popper, s/d). Assim é, me parece, a arte de Esther Casanova.


Desde quando sentiu o impulso da criatividade, da auto-expressão, sua produção manifestou-se nas mais diversas formas. Nesta exposição encontramos duas delas. Premiada que foi no 8º. Salão de Arte Contemporânea de Marília (2009), agora ela apresenta uma larga produção com o mesmo fio condutor: a escultura/objeto (trabalhos em arame) e a foto-intervenção (o retrabalhar da imagem obtida de seu original, impressa em papel especial). Ambas as séries tratam da linha, síntese final ou início primordial de seu fazer artístico. Linha que norteia e fortalece seus liames com a vida. Linha que ao mesmo tempo identifica a forma e a esconde, num intrincado emaranhar de fios, transformando-a em outro elemento visual – como uma super-microscópica-visão-radiográfica de elementos – e nas possíveis ilações que possamos sonhar ao tentar recompor seu traçado. Linhas que explicitam o território dos sentimentos, da suavidade, da flexibilidade e do feminino.


Nesse fazer, o uso das mãos, para Esther, tem o poder de liberar a emoção e a criatividade. Mas, a razão está ali presente, sempre guiando ou tecendo o fio. Nele sentimos o quanto a artista está envolvida com sua obra. Ação e movimento, espaços visíveis e ocultos compõem a obra. Uma aplicação consciente desses elementos, materiais e técnicas são os maiores aliados para sua transformação. É o elemento visual inquieto e inquiridor que contribui para o processo visual e estético.


O observador precisa de um tempo, de espaço, de girar ao redor para absorver toda a carga e a intenção da artista. Ao mesmo tempo em que se liga à realidade - ao final está aí a representatividade do corpo humano (cabeças e corpos), Esther dela se distancia ao criar campos de tensão entre os cheios (linhas) e os vazios (espaço entre linhas) que são ou deveriam ser reconstruídos, recompostos pelo público. Ela tem a capacidade e a sensibilidade de sintetizar a beleza com exatidão, com energia.

Elvira Vernaschi
Membro da ABCA e AICA-Associação Brasileira e Internacional de Críticos de Arte
Agosto de 2011


Sob o reino da luz

As caixas de luz elaboradas pela artista plástica Esther Casanova são a demonstração de como a pesquisa permanente permite atingir os resultados mais diferenciados. No presente caso, a criatividade se soma ao desenvolver de um pensamento voltado para as questões que cercam a visualidade da obra de arte.


A pintura com diversos materiais sobre placas lisas de isopor permite a exploração de transparências, que se tornam ainda mais relevantes quando uma luz branca propicia o jogo entre claros e escuros e até as ilusões de relevos, obtidas justamente pelo poder do cromatismo de conquistar o espaço.


O curioso é que as pinturas provêm da história da artista em sua relação com a imagem. Algumas de suas composições mais interessantes adquirem no isopor uma nova dimensão e ganham múltiplas e encantadoras visões. O ponto essencial está como as nuanças podem adquirir características plenas de mistério sob o reino da luz.


A presença de azuis, roxos e lilases, por exemplo, gera uma atmosfera que leva a uma percepção mais acurada de cada passo plástico para a construção de uma narrativa pessoal que pode ter numerosas variações, mas que sempre mantém uma unidade no sentido de constituir manifestações visuais de uma mesma problemática.

Oscar D’Ambrosio, jornalista e mestre em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Unesp, integra a Associação Internacional de Críticos de Arte (AICA- Seção Brasil).